quarta-feira, 25 de novembro de 2009

"Salazar e os Milionários" prova cumplicidade entre político e grandes homens de negócios
Lusa, 25 de Novembro de 2009
O livro do jornalista Pedro Jorge Castro «Salazar e os Milionários», que é hoje apresentado em Lisboa, traz à luz do dia aquilo que todos advinhavam mas não podiam provar: «a grande cumplicidade» entre o político e os maiores homens de negócios do seu tempo.
«Em vários aspectos, reforça as ideias que poderíamos ter. Já havia uma ideia da grande cumplicidade entre Salazar e os empresários mas não era palpável, não havia informações sobre essa cumplicidade", explicou à agência Lusa o jornalista.
No livro, com a chancela da Quetzal Editores, Pedro Jorge Castro comenta a sociedade da época: «Os operários aceitavam salários baixos, o Estado mantinha a ordem nas ruas, a Igreja conservava o decoro nos costumes e os amigos políticos facilitavam os negócios - era assim que os empresários se moviam durante o Estado Novo».
O livro divide-se em quatro partes: na primeira, descreve-se a relação de Salazar com o dinheiro, na sua vida particular e na sua concepção política da economia; a segunda parte é totalmente dedicada à ligação com o banqueiro Ricardo Espírito Santo; a terceira visa as relações entre o governante e os outros milionários; por último, referem-se alguns negócios onde se cruzam vários empresários.
«Houve uma cumplicidade evidente, com benefícios para todos: os empresários prosperaram nos negócios e ajudaram Salazar a manter o seu poder absoluto», opina o investigador.
Apesar de tudo parecer ter já sido dito e escrito sobre Salazar, surgem pormenores curiosos sobre a sua personalidade, tal como não discutir em Conselho de Ministros algumas questões, alegando que alguns ministros eram casados (pelo que poderiam comentar com as mulheres os assuntos de Estado) ou de pôr Ricardo Espírito Santo a acompanhar a namorada Christine Garnier nas suas visitas a Portugal, sempre que ele próprio estava ocupado.
Depois surgem os negócios, desde a construção do Ritz ou da Ponte sobre o Tejo, o petróleo, os diamantes... para quem dizia que «se tivesse de haver competição, continuaria a preferir a agricultura à indústria», Salazar revela um grande pendor empresarial.
É também estranha a enorme admiração que alguns desses homens viajados e tão poderosos economicamente nutrem pelo ditador.
«Para mim, foi como um dia de sol em que também chovesse. No andor maravilhoso que eu tinha ideado e realizado faltava o santo», escreve Ricardo Espírito Santo ao comentar a ausência de Salazar numa inauguração que ele patrocionou.
No livro, são transcritos 11 rascunhos de Salazar, bem como 141 cartas e 16 telegramas de 19 empresários.
Muito fica ainda por revelar. Algumas famílias desses empresários não se mostraram abertas a revelar as cartas em que Salazar respondia às missivas dos seus patriarcas.
«É impossível fazer um trabalho definitivo porque muito material está na posse das famílias mas da maioria delas não houve abertura», comenta Pedro Jorge Castro.
A ideia de escrever este livro surgiu ao Autor depois de fazer uma reportagem sobre o tema, a propósito dos 120 anos do nascimento do político. Na Torre do Tombo, descobriu material «absolutamente extraordinário, muito extenso», que «surpreendeu as pessoas».
No final do trabalho jornalístico, lamentou «não partilhar com os leitores» esse material e acabou por escrever este livro.
No momento em que o livro sai do prelo, o jornalista diz ter feito «tudo o que era possível» sobre o tema mas admite que em breve poderão ser revelados novos dados: «Não encaro [o livro] como algo acabado, há muita informação que pode aparecer».
Salazar «dissimulava muito mas não encontrei nada que indiciasse que era corrupto». Mesmo assim, o Autor continua a achar «que ele tem um lado sombrio, muito difícil de entender» e que passou por «várias fases de actuação».
Num ponto, confessa a sua admiração: "Surpreendeu-me a capacidade que ele tinha para escrever tanta coisa e o tempo que tinha. Tinha que ter muito tempo para escrever».
«Na Torre do Tombo, há 280 caixas só de correspondencia - cada uma com cerca de 500 papéis", recorda Pedro Jorge Castro.

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