segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

As crianças dos países ricos passam a maior parte do dia longe dos pais
15.12.2008, Fernando Sousa
Os países mais ricos não estão a dar a atenção que deviam às crianças, que passam a maior parte do dia confiados a outros, enquanto os pais trabalham, diz o Fundo das Nações Unidas para a Infância e Juventude (UNICEF) num relatório acabado de publicar. Portugal é um deles: no conjunto dos países da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), está entre os menos empenhados. Num conjunto de dez indicadores de referência relativos a educação e cuidados com a primeira infância, a Suécia é de todos os 25 membros da OCDE estudados o que mais cumpre - tem a cotação máxima. O pior classificado neste quadro comparativo é a Irlanda, com apenas um. Portugal tem quatro, um ponto abaixo da média. Portugal não está mal na política de prioridade às crianças mais desfavorecidas e na formação do pessoal de serviços que acolhem as crianças menores. Mas falha nos outros seis itens: não tem licença para pais durante um ano e com 50 por cento do ordenado quando nasce um filho, não tem cuidados subvencionados para 25 por cento dos que têm menos de três anos, não cumpre a proporção mínima entre o pessoal e as crianças no pré-escolar, e investe um mínimo de um por cento do Produto Interno Bruto nos serviços prestados à primeira infância. Além disto, estamos mal na taxa de pobreza infantil, que deveria ser abaixo de dez por cento, e na universalidade dos serviços de saúde.
A UNICEF estudou duas faixas etárias - dos três aos seis anos e dos zero aos três. Em qualquer delas, a percentagem de crianças que passam o dia fora, ao cuidado de terceiros, é elevadíssima, com tendência para aumentar. É urgente que os Governos invistam mais nos cuidados e educação primários, diz o relatório. No primeiro dos casos, 80 por cento das crianças frequentam estruturas de acolhimento fora da casa de família. Os países onde o número é de 100 por cento são a França, Itália, Bélgica e Espanha. Portugal vem a seguir à Alemanha e antes da Eslovénia. Pelo contrário, os Estados Unidos, com uma percentagem de 60 por cento, estão abaixo da média dos países da OCDE. Os números são comparativamente mais baixos no segundo caso, mas ainda assim elevados. Na Dinamarca e na Islândia, a fatia de pais que confiam os filhos do nascimento aos três anos à guarda de instituições chega aos 60 por cento. Os franceses aqui vêm com 30 por cento, seguidos dos alemães, húngaros e italianos com menos de dez por cento. O México tem a mesma pontuação. Já aqui a média norte-americana é de 50 por cento. Os peritos relacionam todos estes números com a presença cada vez maior das mulheres ao mercado de trabalho. No espaço da OCDE, mais de dois terços trabalham fora de casa. Em França, por exemplo, a sua percentagem alcança 63,9 por cento, enquanto nos homens ela é de 53,7.
A UNICEF, que não se limita a dar números, sublinha que na maioria dos países estudados as mulheres têm hoje muito mais oportunidades de carreira do que há dez anos. Mas as cifras mostram também que, quanto mais pobre é a família, maior é a urgência das mães em regressar o mais depressa possível, depois do parto, aos seus empregos. E igualmente maiores são os riscos para o crescimento e desenvolvimento dos filhos, entregues tão cedo a cuidados que podem não primar pela qualidade. Um passo em falso neste sentido pode ter efeitos indesejáveis na aprendizagem das crianças, e se isso é quase certo em relação às suas capacidades cognitivas e linguísticas, vale também para o desenvolvimento psicológico e emocional, diz o relatório. "A atenção e educação de alta qualidade para a primeira infância têm possibilidades enormes de melhoramento do desenvolvimento cognitivo, linguístico, emocional e social", diz Marta Santos Pais, directora do centro de investigação da UNICEF, citada num comunicado de imprensa.

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